Dos Excluídos da Sucessão

direito

Abordarei aqui a exclusão da sucessão. Desta vez não farei uma análise eminentemente doutrinal, preferindo comentar o direito posto artigo por artigo. Assim sendo, debruçemo-nos sobre o art. 1814º do Código Civil:
Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:
I – que houverem sido autores, co-autores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;
II – que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;
III – que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.

São excluídos da sucessão os herdeiros e legatários que tiverem praticado atos criminosos, ofensivos e desabonadores, de extrema gravidade, contra a pessoa, a dignidade ou os interesses do autor da herança, ou de familiares deste. Os casos de exclusão sucessória estão taxativamente tipificados no supracitado artigo. Trata-se de uma pena civil, cuja interpretação afasta o recurso à analogias e ampliações.
Procede o Código Civil a respeito do tema:

Art. 1.815. A exclusão do herdeiro ou legatário, em qualquer desses casos de indignidade, será declarada por sentença.
Parágrafo único. O direito de demandar a exclusão do herdeiro ou legatário extingue-se em quatro anos, contados da abertura da sucessão.

Embora tenha praticado qualquer daqueles atos elencados no artigo anterior, a exclusão de herdeiro não se dá de pleno direito, pela simples força legal. É necessário que se intente a ação com reconhecimento de indignidade e a subsequente declaração em sentença judicial.
O direito de ingressar com a ação, visando à exclusão do herdeiro ou legatário está submetido ao prazo decadencial de quatro anos, contados da abertura da sucessão. Findo o prazo a demanda não mais pode ser apresentada e a situação se consolida. O herdeiro não pode mais ser atacado.
Vale recordar que a ação tem de ser apresentada em vida do que praticou o ato passível de exclusão da herança. Caso ele morra antes de ter sido iniciada a ação, esta não é mais possível, embora possa prosseguir, se foi apresentada antes de o indigno falecer.
Mas, e quanto aos efeitos da exclusão?

Art. 1.816. São pessoais os efeitos da exclusão; os descendentes do herdeiro excluído sucedem, como se ele morto fosse antes da abertura da sucessão.
Parágrafo único. O excluído da sucessão não terá direito ao usufruto ou à administração dos bens que a seus sucessores couberem na herança, nem à sucessão eventual desses bens.

Sendo uma pena civil, os efeitos da exclusão são pessoais, não incidindo à descendência do indigno. Trata-se aí do princípio constitucionalmente consagrado da responsabilidade pessoal. Declarado por sentença o afastamento, o indigno é tido como se premorto fosse. Desta feita os descendentes do herdeiro excluído sucedem no lugar dele, pelo direito de representação.
É interessante observar a seguinte diferença: o que renuncia à herança é considerado estranho à sucessão, é tido como se jamais tivesse sido herdeiro; o excluído da sucessão ou indigno de suceder é considerado como se fosse morto antes da abertura da sucessão, abrindo-se exceção ao princípio segundo o qual não se pode representar uma pessoa viva.

Art. 1.817. São válidas as alienações onerosas de bens hereditários a terceiros de boa-fé, e os atos de administração legalmente praticados pelo herdeiro, antes da sentença de exclusão; mas aos herdeiros subsiste, quando prejudicados, o direito de demandar-lhe perdas e danos.
Parágrafo único. O excluído da sucessão é obrigado a restituir os frutos e rendimentos que dos bens da herança houver percebido, mas tem direito a ser indenizado das despesas com a conservação deles.

Este artigo copia a solução do 1600º do Código Bevilácqua. Antes da sentença excludente, o indigno mostra-se diante de todos como verdadeiro herdeiro. A aparência e a boa fé de terceiros são legalmente reconhecidas. Reputam-se válidas as alienações onerosas de bens hereditários a terceiros de boa fé, bem como os atos de administração que legalmente tenham sido praticados antes da sentença judicial de exclusão.
Para encerrar, cabe indagar se a exclusão, uma vez sentenciada, é definitiva e imodificável. Novamente, o Código Civil dá-nos a resposta:

Art. 1.818. Aquele que incorreu em atos que determinem a exclusão da herança será admitido a suceder, se o ofendido o tiver expressamente reabilitado em testamento, ou em outro ato autêntico.
Parágrafo único. Não havendo reabilitação expressa, o indigno, contemplado em testamento do ofendido, quando o testador, ao testar, já conhecia a causa da indignidade, pode suceder no limite da disposição testamentária.

A reabilitação do indigno tem de ser expressa. Por mais que se reconciliem, deixando tal publicamente demonstrado, tal é insuficiente. Apenas em escritura pública ou em testamento a reabilitação do indigno por parte do ofendido pode ser feita. O perdão tem de ser explícito e inequívoco.
O que o supracitado dispositivo denomina “ato autêntico” é a escritura pública. Pode ocorrer de o indigno ser beneficiado em testamento do ofendido, quando já conhecida do testador a causa de indignidade. Faltando a reabilitação expressa, a situação permanece tal qual está. Porém, o indigno será chamado a suceder no limite da disposição testamentária.
O parágrafo único do art. 1818º constitui-se de uma inovação do Código Reale em relação ao Código de 1916. Inspira-se no art. 466º, al. 2 do Código Civil italiano, por sua vez inspirado no art. 2038º, 2, do Código Civil Português.

Sobre Fábio V. Barreto

Católico, aprendiz de escritor, ávido por conhecimento, e outras coisas mais.
Esse post foi publicado em Direito e marcado , . Guardar link permanente.

Deixe um comentário